Blog: Sobre estar sozinho - Leandro Silvério

Blog: Sobre estar sozinho


Se tem algo que certamente nos chama atenção nesse mundo contemporâneo (e líquido) como já bem definiu o genial sociólogo Polones Zygmunt Bauman, são as conseqüências trazidas pelos avanços tecnológicos inseridos a todo momento e experimentados dia após dia em nossa geração.

Não apenas por marcar-se em avanço cronológico pelo início desse milênio, mas de fato os avanços que permeiam o campo da tecnologia influenciam diretamente nossas interações humanas no que tange a relações afetivas e, principalmente, o conceito de Amor.

O que se busca hoje, e é aqui que nasce a reflexão desse texto, é em verdade uma experimentação no sentido de "vive-se" aquilo que única e exclusivamente "compartilha-se"; de tal sorte que se um indivíduo não compartilhou em suas mídias sociais aquilo que vive em um instante de tempo, ele por incredulidade de si próprio duvida da veracidade do fato, contendo de sua própria existência a plenitude da experimentação.

Em resumo, nos dias de hoje abre-se mão da interdependência para dar voz ativa ao outro sempre e quando o responsabilizamos pelo nosso próprio bem-estar.

Essa ideia não traz consigo nenhuma carga de capital romântico ou apaixonante, muito pelo contrário. Trata apenas de um compartilhamento exacerbado de informações não-requisitadas que inundam a rede mundial de computadores permeando entre o factual e o abstrato, angariando novos adeptos de um mundo fantasioso que existe de maneira única na mente de cada indivíduo que, quando compartilha informação o faz por motivos inerentes a si mesmo e, quando não o faz, também exerce tal atitude permeado pelas mesmas razões.

Com o avanço tecnológico, que exige mais tempo individual, as pessoas estão perdendo medo de ficarem sozinhas. Ninguém é sozinho o tempo todo. Tudo é compartilhado. Tudo é dividido. O medo e a angustia, antes pautados única e exclusivamente aos lares de famílias que se formavam, hoje pode ser dividido até com estranhos ao seu meio, em grupos com objetivos comuns e que, em teoria, experimentam situações e desafios similares aos que você vive. Já não existem mais príncipes, princesas e salvadores da pátria. Somos companheiros de viagem, solitários, que interagem com outros solitários a sua volta.

Como bem definiu o médico Psiquiatra Flávio Gikovat: "estamos entrando na era da individualidade, o que não tem nada a ver com egoísmo. O egoísta não tem energia própria; ele se alimenta da energia que vem do outro, seja ela financeira ou moral. A nova forma de amor, ou mais amor, tem nova feição e significado". E complementa: "quanto mais o indivíduo for competente para viver sozinho, mais preparado estará para uma boa relação afetiva."

Nessa linha podemos então assumir que ficar sozinho, de fato, talvez seja bom e que ao experimentar sua construção (ou reconstrução) individual você, na verdade, está inundando seu mundo de experimentações únicas que quando compartilhadas com outro ser em equivalência intelectual ao que se vive, certamente dará origem a um novo grau de relacionamento. Um grau mais elevado, saudável, pautado na individualidade de certezas e incertezas de quem pouco a pouco aprendeu a viver e sabe que uma vida não é tempo o suficiente para entender sobre tudo aquilo que há de ser entendido.

Leandro Silvério.


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