Conto autoral: O galinheiro
Tenho lembranças de minha infância vivida como quem se lembra o que comeu no almoço em experimentação da própria rotina. Lembro de conversas que tive em família onde expunham-se os desafios mútuos de cada ser que ali convivia e tudo entre nós era partilhado, tudo era dividido. Metade do mamão para o almoço, metade do pão sempre se guardava para o outro dia.
Em uma casa antiga de tijolos vermelhos aparentes, com pedaços de madeiras estampados como juntas e vigas, Minha morada era como as casas das histórias que lia nos livros distribuídos na escola. Cercada por árvores frondosas e vertiginosas em volta, algumas frutíferas que sequer alimentavam os pássaros, pois de fruto comestível eu e meus irmãos tudo conhecíamos e tamanha iguaria, não chegava sequer a crescer; eram todos abatidos e devorados quase que em seu leito para fazer alegria ao estômago, quase sempre vazio.
Havia também um riacho, que corria aos fundos da casa e o que mais me chamava atenção naquele cenário era a água, calma e tranqüila. Sobre o riacho, uma pequena ponte de madeira onde nos aventurávamos tentando atravessar, agarrando em cordas e pedaços de pau a pique. Peixes não eram muitos, apenas alguns girinos que quando cresciam, entoavam o Cântico dos Sapos pela madrugada adentro, até o nascer do próximo dia.
Que maravilha eram aquelas tardes em volta da fogueira, quando a noite caía devagar e o vento empurrava pelo ar o sussurro das folhas tocadas por ele em tudo o que ali havia. Ouvia mensagens do vento, era como se conversasse comigo dizendo: - Hey menina, estou aqui. Sou eu, o vento do futuro; que carrega o tempo morro acima em estrada longa que um dia se finda. Guarde contigo os segredos desse mundo, leve para si apenas as maravilhas.
Tinha mesmo esse costume de ouvir os sons da natureza. Conversava com as árvores, para garantir sombra e com o riacho, afim de que sempre houvera água fresca. Conversava com os pássaros para entoarem os melhores cânticos e com as formigas, para preservarem nossa casa firme sem que houvesse queda das madeiras em alvenaria. Entretanto essa foi a primeira vez que uma mensagem houvera sido proferida diretamente a mim como resposta. O vento falou comigo, me recomendou guardar segredo de algo que admito, na época eu nada sabia.
Foi então que numa noite escura de frio intenso, enquanto todos dormiam eu olhei pela vidraça e vi as galinhas do meu quintal se aglutinarem no Galinheiro. Era como se fossem as componentes de um coral, distribuídas de maneira igualitária se posicionando para uma audição final. Tenores e Baixos ao fundo, enquanto as Contraltos e Sopranos à frente. E tal apresentação se repetiu nas noites subseqüentes. Eu espectadora afoita, as vezes ficava da janela observando o movimento frenético das aves que cacarejavam sem parar até encontrar uma posição confortável no Galinheiro. Imaginava que estas eram então galinhas que compunham o publico extasiado do evento, procurando desesperadas o melhor espaço no ginásio em audição que estava prestes a se iniciar em qualquer momento.
E assim, a noite caía sobre esse pequeno ponto no espaço. Minha casa, em família que repousa enquanto os animais noturnos fazem morada. Com a noite, paira também o silêncio envolvente do Galinheiro em peça única, teatral e majestosa que chegara ao fim, como se fosse um lençol escuro e protetor que em mim se pôs à aconchegar trazendo paz, alento e repouso enfim. O descanso tomava conta de tudo por aqui até que surgisse no horizonte o primeiro raio de sol. A paz indubitavelmente habitava naquele lugar e ao amanhecer, era o Galo responsável por anunciar. Nesse instante, ele se colocava cantante acordando a gritar e junto com os primeiros raios do dia, tudo começava a se mover novamente. Aves, pessoas, animais e a vida pulsante retomava seu fôlego, para mais um dia realizar.
No Galinheiro, cenário perfeito para recolher os ovos e preparar o café da manhã. Só eu sabia e não contava para ninguém, mas aqueles ovos eram de fato pagamento depositado pelo show majestoso que outrora no Galinheiro se fazia perpetuar. Ovos recolhidos por minha mãe um a um e transformados em bolos, omeletes, tortas ou simplesmente mexidos e compartilhados por todos da família.
Após o café, era chegado o momento de contar as Galinhas e nessa hora, eis que o número não batia. Faltava uma, chamada Corita e dela, ninguém sabia. Espanto geral, primeira hipótese era que houvera sido devorada por algum animal. Procurava-se por rastros de um eventual confronto ou mesmo, marcas do funeral. Nada encontrado, cogitava-se que Corita havia fugido e por outras bandas, escapado para nunca mais voltar. Os dias se passaram e de minha janela, não mais se via show no palco do Galinheiro. Parecia que as galinhas se resguardavam pela falta da irmã, alegria pulsante não mais emanava ato após ato naquele lugar.
Seguiram-se os dias, seguiram-se as buscas. Procurávamos em sítios vizinhos e também pelas ruas; nada encontrado. Corita de fato havia partido e a nós restava apenas seguir e continuar, mesmo que com o coração desolado. Eis que certo dia eu, já em aceitação por sua partida ouço ao longe um "cacarejado" às margens do riacho, embaixo da ponte que cobria as águas frias. Ali estava ela, Corita, que em um ninho improvisado seis ovos protegia. Ela havia fugido do Galinheiro para garantir sua cria. Me olhou nos olhos como quem dizia: - Hey menina, sou amiga do vento e nosso segredo é você nunca dizer que me viu fazer morada escondida sob a ponte um dia.
Entendi prontamente sua mensagem e com sorriso no rosto parti, retomei minha rotina. Semanas se passaram, meses a fio até que um dia em um jantar de família, ao longe avistamos certa movimentação que vinha do riacho em plena luz do dia. Corita havia retornado ao lar e junto a ela, seis lindos filhotes bravamente a seguiam. Corita houvera dado a luz e tal sublime fato, justificara enfim sua partida. Seguia caminho sem pestanejar em meio ao nosso jantar subitamente interrompido. Retornava ao Galinheiro de onde partira. Extasiados e atônitos ficamos todos ao ver tamanha braveza e afinco daquele pequeno ser e seus filhotes recém nascidos. Esse era o legado de Corita, em segredo guardado por ela e todos da família. Exceto eu, que sobre tudo já sabia. Antes de ingressar no Galinheiro e retomar seu espaço no show da noite que antevia, Corita me olhou nos olhos como quem novamente diz: - Hey menina, obrigado por guardar nosso segredo. Hoje será estréia de novas vozes para o coral do Galinheiro e você é convidada especial, tem lugar cativo no puleiro e em minha lembrança, sem data de partida.
Esse foi meu primeiro segredo compartilhado e adquirido. Guardado por mim anos a fio, com leveza de sentimento e paz de espírito. Jamais me esquecerei de Corita e seus filhotes; seu legado construído. Naquela noite o Galinheiro experimentou pela primeira vez um espetáculo composto por exímios novos maestros de sonhos, em platéia híbrida entre humanos e galinhas.
Tenho lembranças de minha infância vivida como quem se lembra o que comeu no almoço em experimentação da própria rotina. Lembro de conversas que tive em família onde expunham-se os desafios mútuos de cada ser que ali convivia e tudo entre nós era partilhado, tudo era dividido. Metade do mamão para o almoço, metade do pão sempre se guardava para o outro dia.
Em uma casa antiga de tijolos vermelhos aparentes, com pedaços de madeiras estampados como juntas e vigas, Minha morada era como as casas das histórias que lia nos livros distribuídos na escola. Cercada por árvores frondosas e vertiginosas em volta, algumas frutíferas que sequer alimentavam os pássaros, pois de fruto comestível eu e meus irmãos tudo conhecíamos e tamanha iguaria, não chegava sequer a crescer; eram todos abatidos e devorados quase que em seu leito para fazer alegria ao estômago, quase sempre vazio.
Havia também um riacho, que corria aos fundos da casa e o que mais me chamava atenção naquele cenário era a água, calma e tranqüila. Sobre o riacho, uma pequena ponte de madeira onde nos aventurávamos tentando atravessar, agarrando em cordas e pedaços de pau a pique. Peixes não eram muitos, apenas alguns girinos que quando cresciam, entoavam o Cântico dos Sapos pela madrugada adentro, até o nascer do próximo dia.
Que maravilha eram aquelas tardes em volta da fogueira, quando a noite caía devagar e o vento empurrava pelo ar o sussurro das folhas tocadas por ele em tudo o que ali havia. Ouvia mensagens do vento, era como se conversasse comigo dizendo: - Hey menina, estou aqui. Sou eu, o vento do futuro; que carrega o tempo morro acima em estrada longa que um dia se finda. Guarde contigo os segredos desse mundo, leve para si apenas as maravilhas.
Tinha mesmo esse costume de ouvir os sons da natureza. Conversava com as árvores, para garantir sombra e com o riacho, afim de que sempre houvera água fresca. Conversava com os pássaros para entoarem os melhores cânticos e com as formigas, para preservarem nossa casa firme sem que houvesse queda das madeiras em alvenaria. Entretanto essa foi a primeira vez que uma mensagem houvera sido proferida diretamente a mim como resposta. O vento falou comigo, me recomendou guardar segredo de algo que admito, na época eu nada sabia.
Foi então que numa noite escura de frio intenso, enquanto todos dormiam eu olhei pela vidraça e vi as galinhas do meu quintal se aglutinarem no Galinheiro. Era como se fossem as componentes de um coral, distribuídas de maneira igualitária se posicionando para uma audição final. Tenores e Baixos ao fundo, enquanto as Contraltos e Sopranos à frente. E tal apresentação se repetiu nas noites subseqüentes. Eu espectadora afoita, as vezes ficava da janela observando o movimento frenético das aves que cacarejavam sem parar até encontrar uma posição confortável no Galinheiro. Imaginava que estas eram então galinhas que compunham o publico extasiado do evento, procurando desesperadas o melhor espaço no ginásio em audição que estava prestes a se iniciar em qualquer momento.
E assim, a noite caía sobre esse pequeno ponto no espaço. Minha casa, em família que repousa enquanto os animais noturnos fazem morada. Com a noite, paira também o silêncio envolvente do Galinheiro em peça única, teatral e majestosa que chegara ao fim, como se fosse um lençol escuro e protetor que em mim se pôs à aconchegar trazendo paz, alento e repouso enfim. O descanso tomava conta de tudo por aqui até que surgisse no horizonte o primeiro raio de sol. A paz indubitavelmente habitava naquele lugar e ao amanhecer, era o Galo responsável por anunciar. Nesse instante, ele se colocava cantante acordando a gritar e junto com os primeiros raios do dia, tudo começava a se mover novamente. Aves, pessoas, animais e a vida pulsante retomava seu fôlego, para mais um dia realizar.
No Galinheiro, cenário perfeito para recolher os ovos e preparar o café da manhã. Só eu sabia e não contava para ninguém, mas aqueles ovos eram de fato pagamento depositado pelo show majestoso que outrora no Galinheiro se fazia perpetuar. Ovos recolhidos por minha mãe um a um e transformados em bolos, omeletes, tortas ou simplesmente mexidos e compartilhados por todos da família.
Após o café, era chegado o momento de contar as Galinhas e nessa hora, eis que o número não batia. Faltava uma, chamada Corita e dela, ninguém sabia. Espanto geral, primeira hipótese era que houvera sido devorada por algum animal. Procurava-se por rastros de um eventual confronto ou mesmo, marcas do funeral. Nada encontrado, cogitava-se que Corita havia fugido e por outras bandas, escapado para nunca mais voltar. Os dias se passaram e de minha janela, não mais se via show no palco do Galinheiro. Parecia que as galinhas se resguardavam pela falta da irmã, alegria pulsante não mais emanava ato após ato naquele lugar.
Seguiram-se os dias, seguiram-se as buscas. Procurávamos em sítios vizinhos e também pelas ruas; nada encontrado. Corita de fato havia partido e a nós restava apenas seguir e continuar, mesmo que com o coração desolado. Eis que certo dia eu, já em aceitação por sua partida ouço ao longe um "cacarejado" às margens do riacho, embaixo da ponte que cobria as águas frias. Ali estava ela, Corita, que em um ninho improvisado seis ovos protegia. Ela havia fugido do Galinheiro para garantir sua cria. Me olhou nos olhos como quem dizia: - Hey menina, sou amiga do vento e nosso segredo é você nunca dizer que me viu fazer morada escondida sob a ponte um dia.
Entendi prontamente sua mensagem e com sorriso no rosto parti, retomei minha rotina. Semanas se passaram, meses a fio até que um dia em um jantar de família, ao longe avistamos certa movimentação que vinha do riacho em plena luz do dia. Corita havia retornado ao lar e junto a ela, seis lindos filhotes bravamente a seguiam. Corita houvera dado a luz e tal sublime fato, justificara enfim sua partida. Seguia caminho sem pestanejar em meio ao nosso jantar subitamente interrompido. Retornava ao Galinheiro de onde partira. Extasiados e atônitos ficamos todos ao ver tamanha braveza e afinco daquele pequeno ser e seus filhotes recém nascidos. Esse era o legado de Corita, em segredo guardado por ela e todos da família. Exceto eu, que sobre tudo já sabia. Antes de ingressar no Galinheiro e retomar seu espaço no show da noite que antevia, Corita me olhou nos olhos como quem novamente diz: - Hey menina, obrigado por guardar nosso segredo. Hoje será estréia de novas vozes para o coral do Galinheiro e você é convidada especial, tem lugar cativo no puleiro e em minha lembrança, sem data de partida.
Esse foi meu primeiro segredo compartilhado e adquirido. Guardado por mim anos a fio, com leveza de sentimento e paz de espírito. Jamais me esquecerei de Corita e seus filhotes; seu legado construído. Naquela noite o Galinheiro experimentou pela primeira vez um espetáculo composto por exímios novos maestros de sonhos, em platéia híbrida entre humanos e galinhas.
Em uma casa antiga de tijolos vermelhos aparentes, com pedaços de madeiras estampados como juntas e vigas, Minha morada era como as casas das histórias que lia nos livros distribuídos na escola. Cercada por árvores frondosas e vertiginosas em volta, algumas frutíferas que sequer alimentavam os pássaros, pois de fruto comestível eu e meus irmãos tudo conhecíamos e tamanha iguaria, não chegava sequer a crescer; eram todos abatidos e devorados quase que em seu leito para fazer alegria ao estômago, quase sempre vazio.
Havia também um riacho, que corria aos fundos da casa e o que mais me chamava atenção naquele cenário era a água, calma e tranqüila. Sobre o riacho, uma pequena ponte de madeira onde nos aventurávamos tentando atravessar, agarrando em cordas e pedaços de pau a pique. Peixes não eram muitos, apenas alguns girinos que quando cresciam, entoavam o Cântico dos Sapos pela madrugada adentro, até o nascer do próximo dia.
Que maravilha eram aquelas tardes em volta da fogueira, quando a noite caía devagar e o vento empurrava pelo ar o sussurro das folhas tocadas por ele em tudo o que ali havia. Ouvia mensagens do vento, era como se conversasse comigo dizendo: - Hey menina, estou aqui. Sou eu, o vento do futuro; que carrega o tempo morro acima em estrada longa que um dia se finda. Guarde contigo os segredos desse mundo, leve para si apenas as maravilhas.
Tinha mesmo esse costume de ouvir os sons da natureza. Conversava com as árvores, para garantir sombra e com o riacho, afim de que sempre houvera água fresca. Conversava com os pássaros para entoarem os melhores cânticos e com as formigas, para preservarem nossa casa firme sem que houvesse queda das madeiras em alvenaria. Entretanto essa foi a primeira vez que uma mensagem houvera sido proferida diretamente a mim como resposta. O vento falou comigo, me recomendou guardar segredo de algo que admito, na época eu nada sabia.
Foi então que numa noite escura de frio intenso, enquanto todos dormiam eu olhei pela vidraça e vi as galinhas do meu quintal se aglutinarem no Galinheiro. Era como se fossem as componentes de um coral, distribuídas de maneira igualitária se posicionando para uma audição final. Tenores e Baixos ao fundo, enquanto as Contraltos e Sopranos à frente. E tal apresentação se repetiu nas noites subseqüentes. Eu espectadora afoita, as vezes ficava da janela observando o movimento frenético das aves que cacarejavam sem parar até encontrar uma posição confortável no Galinheiro. Imaginava que estas eram então galinhas que compunham o publico extasiado do evento, procurando desesperadas o melhor espaço no ginásio em audição que estava prestes a se iniciar em qualquer momento.
E assim, a noite caía sobre esse pequeno ponto no espaço. Minha casa, em família que repousa enquanto os animais noturnos fazem morada. Com a noite, paira também o silêncio envolvente do Galinheiro em peça única, teatral e majestosa que chegara ao fim, como se fosse um lençol escuro e protetor que em mim se pôs à aconchegar trazendo paz, alento e repouso enfim. O descanso tomava conta de tudo por aqui até que surgisse no horizonte o primeiro raio de sol. A paz indubitavelmente habitava naquele lugar e ao amanhecer, era o Galo responsável por anunciar. Nesse instante, ele se colocava cantante acordando a gritar e junto com os primeiros raios do dia, tudo começava a se mover novamente. Aves, pessoas, animais e a vida pulsante retomava seu fôlego, para mais um dia realizar.
No Galinheiro, cenário perfeito para recolher os ovos e preparar o café da manhã. Só eu sabia e não contava para ninguém, mas aqueles ovos eram de fato pagamento depositado pelo show majestoso que outrora no Galinheiro se fazia perpetuar. Ovos recolhidos por minha mãe um a um e transformados em bolos, omeletes, tortas ou simplesmente mexidos e compartilhados por todos da família.
Após o café, era chegado o momento de contar as Galinhas e nessa hora, eis que o número não batia. Faltava uma, chamada Corita e dela, ninguém sabia. Espanto geral, primeira hipótese era que houvera sido devorada por algum animal. Procurava-se por rastros de um eventual confronto ou mesmo, marcas do funeral. Nada encontrado, cogitava-se que Corita havia fugido e por outras bandas, escapado para nunca mais voltar. Os dias se passaram e de minha janela, não mais se via show no palco do Galinheiro. Parecia que as galinhas se resguardavam pela falta da irmã, alegria pulsante não mais emanava ato após ato naquele lugar.
Seguiram-se os dias, seguiram-se as buscas. Procurávamos em sítios vizinhos e também pelas ruas; nada encontrado. Corita de fato havia partido e a nós restava apenas seguir e continuar, mesmo que com o coração desolado. Eis que certo dia eu, já em aceitação por sua partida ouço ao longe um "cacarejado" às margens do riacho, embaixo da ponte que cobria as águas frias. Ali estava ela, Corita, que em um ninho improvisado seis ovos protegia. Ela havia fugido do Galinheiro para garantir sua cria. Me olhou nos olhos como quem dizia: - Hey menina, sou amiga do vento e nosso segredo é você nunca dizer que me viu fazer morada escondida sob a ponte um dia.
Entendi prontamente sua mensagem e com sorriso no rosto parti, retomei minha rotina. Semanas se passaram, meses a fio até que um dia em um jantar de família, ao longe avistamos certa movimentação que vinha do riacho em plena luz do dia. Corita havia retornado ao lar e junto a ela, seis lindos filhotes bravamente a seguiam. Corita houvera dado a luz e tal sublime fato, justificara enfim sua partida. Seguia caminho sem pestanejar em meio ao nosso jantar subitamente interrompido. Retornava ao Galinheiro de onde partira. Extasiados e atônitos ficamos todos ao ver tamanha braveza e afinco daquele pequeno ser e seus filhotes recém nascidos. Esse era o legado de Corita, em segredo guardado por ela e todos da família. Exceto eu, que sobre tudo já sabia. Antes de ingressar no Galinheiro e retomar seu espaço no show da noite que antevia, Corita me olhou nos olhos como quem novamente diz: - Hey menina, obrigado por guardar nosso segredo. Hoje será estréia de novas vozes para o coral do Galinheiro e você é convidada especial, tem lugar cativo no puleiro e em minha lembrança, sem data de partida.
Esse foi meu primeiro segredo compartilhado e adquirido. Guardado por mim anos a fio, com leveza de sentimento e paz de espírito. Jamais me esquecerei de Corita e seus filhotes; seu legado construído. Naquela noite o Galinheiro experimentou pela primeira vez um espetáculo composto por exímios novos maestros de sonhos, em platéia híbrida entre humanos e galinhas.
Nenhum comentário: