Conto autoral: Palavras tortas - Leandro Silvério

Conto autoral: Palavras tortas

Eu já não sei mais quando as histórias da minha vida se acabam, sejam as histórias que escrevo ou as histórias que vivo, em ambos os cenários, me observo seguindo sem saber se são linhas de um conto descrito ou algo mais orgânico, como o sentir na pele de uma leve brisa e o frescor esplendoroso de água pura e cristalina.

Já não sei quando estou entre uma história e a própria vida, por isso sempre fico preso no limar tênue que divide uma e outra, esperando o desfecho que se vivido ou observado, traz em equivalência ao objeto consagrado a distância que separa os olhos da imaginação.

Uma porta abre-se de repente, dando passagem a um novo sonho mesmo que já na meia idade, e com os cabelos levemente prateados, que carregam além de sonhos, experiências acumuladas traduzidas em sabedoria.

Nas mãos, carregava um pequeno dispositivo portátil de construção, chama-o de dedos. Com eles, fez de tudo - do bem, ao mal. Orgulhava-se do bem, esquecia-se do mal.

Olhos castanhos, caneta preta. Sala branca, esferográfica metálica e sentimento mal iluminado. Dentro de si, ideias que fluíam calorosamente em textos sub-entendidos, por si mesmo primeiramente lidos - não era ele quem os narrava.

Claustrofóbico recinto, havia apenas uma cadeira, uma mesa, e uma coisa que escrevia. Era espectador da própria vida, que medicamentosamente em homeopatia o servia. Eram doses de sarcasmo, em gotas de sabedoria. Não sabia se as regurgitava ou engolia. São nas palavras tortas que estão as maiores verdades, que também precisam ser ditas.

Leandro Silvério.


FOTO: DIVULGAÇÃO.


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